Decifrando a decisão de compra como o consumidor escolhe o que e onde comprar no varejo

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Neste artigo vamos decifrar o processo de decisão de compra do consumidor.

Mais de 90% das decisões de compra que são tomadas todos os dias pelos seres humanos são inconscientes. Quem está mais acostumado a realizar pesquisas face to face individuais ou focus group sabe bem que não adianta perguntar para o consumidor o motivo pelo qual ele compra em certa loja mais do que em outras porque existe uma boa chance desta resposta ser equivocada.

Porém, a busca por um entendimento mais amplo sobre o comportamento do consumidor é papel essencial do varejista, pois este, em certa medida, tem poder de influenciar a decisão de compra do consumidor através de algumas estratégias que podem trazer grande impacto em vendas, em margem e também na retenção e fidelização do seu cliente.

Desta forma, o objetivo deste artigo é passar uma visão panorâmica sobre como o consumidor toma suas decisões sobre o que comprar e onde comprar, antes e durante a visita na loja (seja ela uma loja digital ou física).

Como o consumidor toma a decisão de compra?

A resposta de fato desta pergunta é uma ciência por si só. Para quem se interessa por este assunto, uma leitura indispensável é o livro Rápido e Devagar, do Daniel Kahneman, cujos estudos foram tão revolucionários para o entendimento de como o ser humano toma decisões que lhe renderam um Nobel da Economia. Como pontuado, muitas vezes nem mesmo o próprio consumidor sabe as verdadeiras razões que motivaram os seus atos. Uma forma melhor do que simplesmente perguntar, é observar o comportamento dele ao longo de sua jornada de compra e é por este motivo que pesquisas por observação são mais utilizadas para este intuito.

A experiência e observação nos mostram que dois fatores são influenciadores muito importantes para a tomada de decisão de onde comprar:

  • Localização: se a loja é perto de casa, ou no caminho para o trabalho, por exemplo
  • Hábito: se esta loja que o consumidor comumente vai, ou se os pais tinham este hábito quando ele era criança, existe uma tendência natural de repetir este comportamento e visitar a mesma loja

Porém o consumidor também amadureceu ao longo destes últimos anos e se tornou mais consciente de suas vontades e do contexto que o cerca.

Hoje existe uma clareza e um entendimento maior sobre os formatos de loja e seus propósitos, de forma que o consumidor já decifrou o papel de cada um deles dentro de sua decisão de compra. Ele organiza a rotina de compra em cada um destes formatos de loja de acordo com a essência, o propósito principal da sua visita, aqueles produtos e categorias que definem a necessidade primária da compra. Assim, a razão de escolha do lugar onde o consumidor vai comprar segue primeiramente uma lógica baseada na escolha do tipo de compra que ele deve fazer. Quando ele precisa fazer uma compra de abastecimento do lar, em geral na primeira quinzena do mês, o consumidor deve privilegiar um formato de cash and carry (atacarejo), hipermercado ou os grandes supermercados regionais. Neste caso, na média dos consumidores o preço é de longe o critério mais importante e o cliente aceita se deslocar distâncias maiores sabendo que o valor total da compra compensa o custo e o tempo de deslocamento.

Em contrapartida, se o cliente precisa fazer uma compra de reposição, em uma recorrência semanal, o preço continua sendo chave mas não de uma forma tão destacada como em uma compra de abastecimento. A experiência de compra é privilegiada e outros fatores se tornam tão ou mais importantes, como o atendimento em loja e no caixa, o sortimento da loja, a qualidade dos produtos, a rapidez para entrar e sair da loja, o ambiente e os serviços adicionais que porventura ele possa necessitar.

Por fim, em uma compra de urgência que geralmente envolve poucos produtos, o preço se torna bem mais secundário dando lugar à localização, praticidade e rapidez para entrar e sair da loja.

Uma vez que o consumidor sabe qual é o tipo de compra que ele precisa fazer, ele já tem redes de lojas preferidas que mais simbolizam os principais atributos valorizados neste tipo de compra. Mas como ele valoriza estes atributos?

  • Como o consumidor sabe o preço das lojas antes da decisão de compra? De fato, ele não sabe, com exceções a preços que foram veiculados (e conferidos pelo consumidor) em mídias e anúncios (Instagram, TV, tablóide, aplicativo de fidelidade) ou quando ele tenha realizado uma pesquisa de preços (o que é mais comum para compra em grande quantidade ou de itens com alto valor unitário). Para uma cesta típica de compra em um varejo alimentar, em que o consumidor compra uma variedade de produtos, ele pode conhecer com antecedência poucos ou nenhum dos preços da loja. Vários estudos já foram feitos a respeito do número de produtos que são relembrados por um Cliente e geralmente não costuma passar de 5 produtos. Em um anúncio na TV de promoções, esta memória não passa de 2 produtos. São esses produtos que costumam servir de base de referência para construir o que chamamos de percepção de preços ou imagem de preço. Cada vez que ele visita uma loja, ele entra em contato com preços de alguns produtos que ele tem referência de preço, de cabeça. Se o preço está maior ou menor do que aquilo que ele espera e está acostumado, ele reforça ou piora a imagem de preço que possui da sua bandeira e da sua loja. É sobre este ponto que fica muito relevante ter um preço regular, nos produtos mais importantes (aqueles que o consumidor tem mais referência), sempre competitivos.
  • Como o consumidor sabe o sortimento das lojas antes de decidir onde comprar? Da mesma forma, ele não sabe; porém ele tem uma ideia disso a partir das experiências prévias na loja, em outras lojas da mesma bandeira ou mesmo pelo branding do varejista, como ele se posiciona. A Amazon cultivou por muito tempo a alcunha de “A loja de tudo”. Da mesma forma, mesmo que o cliente nunca tenha visitado uma loja específica no formato de hipermercado, ele espera que em uma loja com este porte ele vá encontrar tudo que precisa.

É por isso que a estratégia de promoções e anúncios é tão forte: é uma forma de tentar capturar consumidores que não iriam à sua loja, bem como fortalecer a sua marca e garantir a visita daqueles que já são leais. Segundo a Kantar, o Brasil é um dos países (senão o país) onde a intensidade promocional está entre as maiores. Por que isso é tão presente nos costumes dos brasileiros? Primeiramente, os consumidores gostam de sentir que estão fazendo um bom negócio e que estão economizando. Essa sensação de fazer uma compra inteligente e ser esperto na sua forma de comprar é típico do “jeito brasileiro” (para quem se interessa em entender como esta idiossincrasia nasceu, vale a leitura de Brasil: uma biografia, de Lilia Schwarcz e Heloisa Starling). Também, uma outra explicação provém da necessidade do hipermercado intensificar a sua carga promocional para não perder clientes no final dos anos 90, uma vez que a inflação foi vencida e não justificou mais que o consumidor fizesse compras tão concentradas em hipermercado para não depreciar o seu poder aquisitivo.

No curto prazo, a estratégia promocional é a maneira mais fácil de levar pessoas que não iriam normalmente para sua loja e por isso é tão difundida e utilizada no mercado nacional. Porém, é uma estratégia muito arriscada porque ela é geradora de infidelidade: a loja educa o consumidor a se atentar aos preços e uma loja nunca pode garantir os preços mais baratos o tempo todo. Um dia ela ganha, porém no dia depois ou na semana subsequente, será vencida pela promoção do concorrente, que levará o consumidor a trocar de loja.

Como o consumidor decide o que e quanto comprar?

Após a decisão de “onde comprar”, o comportamento do consumidor dentro da loja é um pouco diferente. Na loja, o consumidor tem informações mais palpáveis de preço, sortimento e disponibilidade e consegue realizar uma decisão um pouco mais informada. Ele vai buscar aqueles produtos / categorias que o levaram à loja em um primeiro momento, complementar sua cesta com outros produtos que compra rotineiramente para abastecimento e realizar algumas compras de impulso de forma eventual.

Como já citado, o consumidor tem uma referência de preços bem estreita, de cerca de 5 produtos apenas. Na próxima vez que você for fazer uma compra, tente se atentar a esse fato sobre suas próprias decisões (só não vale se você for comprador da categoria!). Outro ponto interessante que já foi analisado por economistas comportamentais (como o Daniel Kahneman, já citado neste artigo) é que os consumidores são principalmente sensíveis às diferenças relativas e não aos preços absolutos. Como na maioria das vezes o consumidor não terá o preço do produto na ponta da língua, ele só vai achar que o preço pode ser caro ou barato se ele tem uma referência que o leva a pensar como tal, como a comparação com outros produtos da mesma loja, o ambiente, ou uma comunicação de promoção.

Como o consumidor não consegue (e muitas vezes não quer) tomar uma decisão de compra informada, ele recorre a heurísticas, ou atalhos mentais, para chegar em escolhas rápidas e intuitivas no processo de compra. Estes atalhos evitam que o cérebro se esforce demais no processo de compra e se canse; porém são esses mesmos atalhos que acabam “enganando” o shopper, dando pistas e indícios muitas vezes equivocados sobre o que eles acham que realmente influenciam a sua tomada de decisão de compra.

Em relação ao valor dos produtos, são basicamente 5 fatores que influenciam o consumidor na formação da sua imagem ou percepção de preço. Confira nossa dica bônus para saber mais sobre cada um deles.

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Saiba mais sobre os autores:

Fabien Datas  é Head de Inteligência Comercial do Supermercado Covabra. Possui mais de 20 anos de experiência internacional, trazendo e traduzindo a voz do Cliente e a visão do Mercado em Insights para o Negócio, nas áreas de Marketing e Inteligência Comercial em grandes multinacionais varejistas como Walmart e Carrefour.

Marcus Roggero é diretor de produto e tecnologia na InfoPrice. Um dos fundadores da InfoPrice, empresa de tecnologia especializada em precificação no varejo físico, com foco em coleta de preços de mercado, analytics e software para precificação.

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